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Espírito Santo industrial

Em 1964, houve o Golpe Militar e a interrupção do processo democrático brasileiro. No Espírito Santo, o governador Francisco Lacerda de Aguiar

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em 19 de abr de 2024, às 10h59

Foto: Reprodução/Internet

Por João Gualberto

Em 1964, houve o Golpe Militar e a interrupção do processo democrático brasileiro. No Espírito Santo, o governador Francisco Lacerda de Aguiar, o Chiquinho, eleito em 1962, foi forçado a renunciar, depois de longo processo na Assembleia Legislativa. Em seu lugar assumiu o seu vice Rubens Rangel.

O novo governador entendeu o seu contexto e as modificações que estavam por vir, e transformou o seu curto governo, até 1967, em uma espécie de transição para os novos tempos. Nomeou um dos mais destacados técnicos do seu tempo, Arthur Carlos Gerhardt Santos, como secretário de Planejamento, acumulando a secretaria de Viação e Obras Públicas. Dr. Arthur foi o artífice da nova equipe que contaria com os quadros envolvidos no processo de construção do projeto de desenvolvimento do PSD e da FINDES.

O Dr. Arthur não vinha do sistema político. Ele próprio não tinha vida partidária, mas é filho de Otaviano Santos, deputado estadual por quatro mandatos, sempre pelo partido de Jones e de Carlos, o Partido Social Democrático. Em agosto de 1966 já era público que Christiano Dias Lopes seria o próximo governador, e sua aliança com Rubens Rangel já estava colocada. 

Foi de Christiano a iniciativa de levar o governador Rubens Rangel a pedir à Federação das Indústrias, a FINDES, um Diagnóstico do Desenvolvimento do Espírito Santo.  Antes mesmo da sua posse, o INED – Instituto para o Desenvolvimento Social e Econômico, já tinha entregue o diagnóstico pedido. Foram os responsáveis pelo documento: José Arthur Rios e João Paulo de Almeida Magalhães, dois dos mais prestigiados economistas brasileiros daquela época. Assim, tínhamos um plano forte e bem feito, avalizado por dois grandes economistas de renome nacional. Um grande diferencial.

Os militares eram menos permeáveis ao jogo da política e seu varejo inevitável. Christiano tinha nas mãos um projeto que era o produto do esforço de sua geração, como temos registrado. Ele próprio havia sido chefe de gabinete de Jones dos Santos Neves, em seu governo iniciado em 1951.  Como deputado estadual, foi líder do Governo Lindenberg, depois presidente da Assembleia Legislativa. Conhecia muito bem cada ação que defendia. Esse foi o ponto forte de seu governo: materializar em projetos as necessidades do desenvolvimento capixaba.

Quando os militares começaram a avançar com a sua modernização conservadora, o Espírito Santo tinha um projeto próprio para dialogar com o novo poder instituído. Esse foi nosso ponto forte. O governo estadual pleiteou com suporte técnico, obras como a BR-101, BR-259, BR-482 e a BR 262, sem as quais continuaríamos isolados do mercado nacional. O Plano Rodoviário Estadual, o chamado Projeto Espinha de Peixe, ligava os municípios do interior às BR’s, possibilitando o transporte de pessoas e mercadorias; criando uma articulação, até então, inexistente.

Logo no primeiro ano de governo, muitas medidas estruturantes foram tomadas no campo dos mecanismos de gestão. Tudo estava por ser construído. A Lei estadual 2296 de 1967 deu forma gerencial ao governo. Ao final, tínhamos a Fundação Cultural, a Fundação Hospitalar, a Cesan, O Banestes, a Codes (depois Bandes), a Condusa, a Copesa, a Emcatur, e todo o sistema financeiro, a Escelsa, a Suppin, o Civit e empresas ligadas a secretaria de agricultura. Enfim, uma reforma administrativa de verdade. Ouso dizer que a máquina pública que opera no estado, até hoje, foi criada nesse governo. Nada de relevante foi feito depois disso.

A estratégia básica do desenvolvimento deu-se através dos incentivos fiscais e fundos públicos como o Fundes, o Fundap, o DL 880. A Codes, depois Bandes, foi o órgão gestor de todo esse processo. As ideias foram articuladas através dos chamados Simpósios de Desenvolvimento do Espírito Santo. O primeiro deles foi realizado em julho de 1967. Um outro foi realizado no ano seguinte. Esses eventos constituíram-se em momentos decisivos para a história recente do Espírito Santo.

Christiano trabalhava a ideia de industrializar o estado juntamente com a diversificação agrícola, até porque seu governo convivera com a erradicação dos cafezais. Seria o que ele chamou de agroindústria. A produção de café solúvel com a Realcafé e tantas outras como forma de agregar valor à produção agrícola.

Difícil dizer qual foi o maior legado do Governo Christiano, tamanho foi o volume de feitos e obras. Deixou o Espírito Santo organizado para o desenvolvimento que se acentuaria na sequência, deixou dispositivos fiscais que possibilitariam uma industrialização, até então, apenas sonhada. Foi o líder de uma geração que chegou ao poder com os militares, porém o que se fez no Espírito Santo não foi obra da generosidade do governo nacional.

Nossa industrialização foi o produto das lutas das elites locais e da capacidade de articulação do nosso sistema político, que incluía a participação dos empresários. Duro nas relações políticas, foi implacável com os que insistiam na pequena política. Christiano trabalhava dias e noites no seu projeto. Fez um governo de muito trabalho e muito sucesso.  Um grande estadista a serviço de seu estado.

** João Gualberto é pesquisador e professor Emérito da Universidade Federal do Espírito Santo e Pós-Doutor em Gestão e Cultura (UFBA), e já foi Secretário de Cultura do Espírito Santo de 2014 a 2018.

As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do AQUINOTICIAS.COM

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