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Morre Antonio Cicero, poeta imortal da ABL, letrista e irmão de Marina Lima

O escritor, diagnosticado com Alzheimer, optou pela eutanásia. Ele estava na Suíça, onde a prática é permitida, acompanhado do marido, o figurinista Marcelo Pies.

Por Estadão

4 mins de leitura

em 23 de out de 2024, às 15h08

Foto: Reprodução/ Instagram ABL
Foto: Reprodução/ Instagram ABL

O poeta carioca Antonio Cicero morreu nesta quarta-feira, 23, na Suíça, aos 79 anos. A Academia Brasileira de Letras (ABL) confirmou a informação de que o escritor, diagnosticado com Alzheimer, optou pela eutanásia. Ele estava na Suíça, onde a prática é permitida, acompanhado do marido, o figurinista Marcelo Pies.

“O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia”, ele escreve em sua carta final endereçada a amigos.

Ele escreve ainda: “Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade”. Leia abaixo a íntegra da carta.

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Além de poeta e imortal da ABL, Cicero foi compositor, crítico literário e filósofo

Irmão da cantora Marina Lima, o escritor teve a trajetória na literatura cruzada com o universo da música. Assim, escreveu letras de canções como Fullgás e Pra Começar em parceria com a irmã e também colaborou com outros artistas, como João Bosco, Adriana Calcanhotto e Lulu Santos. Além disso, com Lulu, foi coautor do sucesso O Último Romântico.

Cicero começou a cursar filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e, na sequência, estudou no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). No entanto, ele terminaria seus estudos em Londres, na Universidade de Londres, depois de precisar se mudar para a capital britânica em 1969 por problemas políticos.

Ele é autor de diversas publicações de poesia e reflexões sobre a modernidade. Em 1994, em parceria com o poeta Waly Salomão, organizou o livro O Relativismo Enquanto Visão do Mundo (Editora F. Alves), que reuniu conferências realizadas no projeto Banco Nacional de Ideias, promovido pelos dois poetas com intelectuais de importância mundial.

Dentre os livros de poemas, destacam-se Guardar (Editora Record), de 1996, e A Cidade e os Livros (Editora Record), de 2002. Além disso, em 2001, incluíram o poema Guardar de Cicero na antologia Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século (Editora Objetiva), e em 2005, ele chegou à final do Prêmio Jabuti pelos ensaios filosóficos reunidos em Finalidades sem Fim (Companhia das Letras).

Ele lançou, em 1996, o CD Antonio Cicero por Antonio Cicero, em que recita seus poemas, e participou, em 2002, de uma coletânea de quatro CDs feita com nomes como Gabriel o Pensador, Chico Buarque, Ronaldo Bastos e Fernando Brant em homenagem a Carlos Drummond de Andrade. Portanto, sua contribuição à música e à literatura é notável e diversa.

Imortal da ABL

Cicero foi eleito imortal na ABL no dia 10 de agosto de 2017, ocupando a cadeira número 27 e sucedendo Eduardo Portella. “O que é um poema imortal? Um poema imortal é um poema cujo valor não depende de fatores externos a ele: um poema, portanto, que vale por si”, declarou ele em seu discurso de posse.

Há algumas semanas, Marina Lima havia publicado uma homenagem pelo aniversário do poeta no Instagram. “Cicero é meu maior parceiro nesses anos todos de carreira, um grande letrista, poeta e filósofo que tenho a alegria de ser irmã”, escreveu na ocasião.

Carta de despedida de Antonio Cicero

Queridos amigos,

Encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia. Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo. Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha terrível situação. A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas – senão a coisa – mais importante da minha vida. Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los. Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade.

Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!

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