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Nacional

Descriminalização do porte de drogas: quais os argumentos dos ministros?

Oito dos 11 ministros já votaram sobre o tema, e o placar está em cinco votos a três a favor da descriminalização do porte de maconha para uso próprio

Por Estadão

9 mins de leitura

em 11 de mar de 2024, às 10h52

Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

O Supremo Tribunal Federal (STF) julga se o porte de drogas para consumo pessoal deve ser considerado crime ou não. A análise foi retomada no último dia 6, mas novamente interrompida pela Corte. No entanto, oito dos 11 ministros já votaram sobre o tema, e o placar está em cinco votos a três a favor da descriminalização do porte de maconha para uso próprio.

Aliás, os ministros favoráveis à descriminalização argumentam que o uso de pequena quantidade de maconha é um direito de cada pessoa, com consequências individuais à saúde dos usuários. Sobretudo, também consideram que o fato de o porte ser crime aumenta o encarceramento de pessoas vulneráveis.

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Todavia, os ministros contrários avaliam que a descriminalização do porte de maconha para consumo próprio pode estimular o vício e agravar o combate às drogas no país. Além disso, alegam que a decisão do Supremo de tornar o ilícito administrativo pode criar uma lacuna sobre o tipo de punição e o responsável por aplicá-la.

A Suprema Corte está julgando a constitucionalidade do Artigo 28 da Lei das Drogas, que, para diferenciar traficantes de usuários, descreve penas alternativas para “quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. Aliás, as penas podem ser prestação de serviços comunitários, advertência sobre os efeitos das drogas e cursos educativos obrigatórios.

Votação

Apesar de deixar de prever a prisão dos usuários, a lei, que passou a vigorar em 2006 e instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, manteve a criminalização dos usuários, que podem ser alvos de inquérito policial e processos judiciais. Entretanto, não há diretrizes objetivas sobre a quantidade de droga que faz alguém ser enquadrado como usuário ou como traficante.

No entanto, até agora, o colegiado formou maioria para fixar uma quantidade da planta para haver diferenciação clara sobre quem é usuário e quem é traficante. Aliás, ainda não há consenso, entretanto, sobre quantos gramas farão essa marcação.

Portanto, a votação começou em 2015 e tinha sido paralisada pela última vez em agosto de 2023, quando o ministro André Mendonça solicitou mais tempo para avaliar o processo. Aliás, o julgamento foi novamente interrompido por um pedido de vista, agora do ministro Dias Toffoli. Além dele, ainda faltam votar os ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia.

Porte de drogas

Portanto, veja como votou cada ministro até agora e quais foram os argumentos usados para justificar o posicionamento contrário ou favorável à descriminalização da maconha.

Gilmar Mendes

Posição: A favor da descriminalização.

Quando votou: 20 de agosto de 2015 e reformulou em 24 de agosto de 2023.

Quantidade para porte: 25 a 60 gramas ou seis plantas fêmeas.

Argumento: O ministro relator do caso, Gilmar Mendes, defende que a conduta de usuário de drogas não é crime. Aliás, quando proferiu seu voto, em 2015, ele tinha esse entendimento para todos os tipos de drogas, mas em 2023 seguiu o voto do ministro Edson Fachin e passou a considerar apenas a maconha.

“A tipificação penal do Artigo 28 afronta o postulado constitucional da proporcionalidade, por se tratar de conduta cuja lesividade se restringe à esfera pessoal do usuário”, disse o ministro, ao reformular o voto no ano passado.

Edson Fachin

Posição: A favor da descriminalização.

Quando votou: 10 de setembro de 2015.

Quantidade para porte: Diz que os parâmetros para diferenciar traficantes de usuários não devem ser fixados pelo Judiciário, mas sim pelo Legislativo.

Argumento: O ministro Edson Fachin afirmou que a regra é inconstitucional exclusivamente em relação à maconha, e que o consumo da substância faz parte da autodeterminação individual e que não causa dano a bem alheio.

De acordo com o magistrado, caracterizar o uso de maconha como crime é uma atitude moralista e paternalista do Estado. Fachin ressalvou que o tema é “hipercomplexo” e “não há resposta perfeita”.

Votos a favor

Luís Roberto Barroso

Posição: A favor da descriminalização.

Quando votou: 10 de setembro de 2015.

Quantidade para porte: 25 gramas ou seis plantas fêmeas.

Argumento: Para o ministro Luís Roberto Barroso, as estatísticas mostram que descriminalizar a maconha não produz impacto relevante sobre o consumo da substância. Portanto, não faz sentido o Estado continuar gastando com prisões, mantendo um alto índice de encarceramento, para manter o nível de consumo nos mesmos patamares.

Aliás, o ministro defendeu a adoção de 25g com base na experiência de Portugal, que descriminalizou o porte de drogas em 2001. Barroso argumentou ser prudente seguir a experiência de um “país com uma bem sucedida experiência de mais de uma década na matéria”.

Alexandre de Moraes

Posição: A favor da descriminalização.

Quando votou: 2 de agosto de 2023.

Quantidade para porte: 60 gramas ou seis plantas fêmeas.

Argumento: Alexandre de Moraes defendeu que desde a criação da Lei de Drogas, por haver critérios objetivos sobre consumo e tráfico, a norma é interpretada de formas diversas, o que fere o princípio da isonomia. O ministro argumentou que a população carcerária aumentou significativamente graças ao porte de pequena quantidade de entorpecentes passar a ser qualificado como tráfico e propôs que pessoas flagradas com 25g a 60g de maconha ou seis pés de maconha sejam presumidas como usuárias. No entanto, Moraes chegou nesse número usando como base o volume médio de apreensão de drogas no Estado de São Paulo, entre 2006 e 2017.

“A necessidade de equalizar uma quantidade média padrão como presunção relativa para caracterizar e diferenciar o traficante do portador para uso próprio vai ao encontro do tratamento igualitário entre os diferentes grupos socioculturais, como medida de Justiça e Segurança Jurídica, diminuindo-se a discricionariedade das autoridades públicas”, afirmou.

Votação anterior

Rosa Weber (aposentada)

Posição: A favor da descriminalização.

Quando votou: 24 de agosto de 2023.

Quantidade para porte: 60 ou 100 gramas.

Argumento: Rosa Weber afirmou que a criminalização da conduta – o porte de maconha – é desproporcional, por atingir de forma veemente a autonomia privada. Segundo a ministra, a mera tipificação como crime do porte para consumo pessoal potencializa o estigma que recai sobre o usuário e acaba por aniquilar os efeitos pretendidos pela lei em relação ao atendimento, ao tratamento e à reinserção econômica e social de usuários e dependentes.

A magistrada afirmou que uma decisão favorável a criminalização seria “transformar todo usuário de entorpecente em potencial traficante e criminoso”.

Como a ministra já deixou seu voto registrado, seu sucessor, o ministro Flávio Dino, não poderá mudar o entendimento da ministra aposentada.

Cristiano Zanin

Posição: Contra a descriminalização.

Quando votou: 24 de agosto de 2023.

Quantidade para porte: 25 gramas ou seis plantas fêmeas.

Argumento: Cristiano Zanin reconheceu que o atual sistema penal é falho, e que não despenaliza pessoas negras, pobres e de baixa escolarização. Mas no entendimento do ministro, a descriminalização apresenta “problemas jurídicos” que podem agravar o combate às drogas. Ele citou que a descriminalização, “ainda que parcial do consumo de drogas”, poderia contribuir para um suposto agravamento de problemas de saúde pública relacionados ao vício.

O voto contra a descriminalização da maconha provocou críticas de apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que consideraram a posição do ministro conservadora. O posicionamento sobre porte de drogas para uso pessoal foi um dos primeiros do indicado pelo petista à vaga no STF.

Votos contrários

André Mendonça

Posição: Contra a descriminalização.

Quando votou: 6 de março de 2024.

Quantidade para porte: 10 gramas, mas só até o Congresso decidir sobre o tema.

Na avaliação de André Mendonça, a descriminalização do porte da maconha para uso pessoal é uma tarefa do Poder Legislativo. “Vamos jogar para um ilícito administrativo. Qual autoridade administrativa? Não é para conduzir para a delegacia? Quem vai conduzir quem? Para onde? Quem vai aplicar a pena? Ainda que seja uma medida restritiva. Na prática, nós estamos liberando o uso.”

Mendonça defendeu que seja dado prazo de 180 dias para que o Congresso estabeleça critérios objetivos para diferenciar usuários de possíveis traficantes. Após ler esse e outros estudos com tal conclusão, o ministro afirmou: “Aliás, isso faz a maconha, isso faz fumar maconha. É o primeiro passo, se é pra dar o primeiro passo, para precipício”.

Kassio Nunes Marques

Posição: Contra a descriminalização.

Quando votou: 6 de março de 2024.

Quantidade para porte: 25 gramas ou seis plantas fêmeas.

Argumento: Segundo o ministro Nunes Marques, o recurso que pede a declaração de inconstitucionalidade do artigo da Lei de Drogas envolve uma “reorientação radical da jurisprudência” do STF. Para o magistrado, o Legislativo despenalizou a conduta ao prever punições diversas da prisão.

Aliás, na avaliação do ministro, os parlamentares adotaram uma política criminal “voltada claramente para o desencarceramento” diante do problema de lotação dos presídios, além de “priorizar aspectos pedagógicos e informativos em torno do malefício das drogas, de modo a afastar a estigmatização dos usuários”.

Portanto, assim como Barroso, o ministro também fez menção à experiência de Portugal com a descriminalização da maconha. “A descriminalização poderia induzir consequências imprevisíveis sobre o consumo em locais públicos, principalmente em escolas e outros locais frequentados por crianças e adolescentes”, disse.

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