Internacional

Trump bate-boca com Zelenski, que sai da Casa Branca sem acordo

A reunião diante das câmeras, que normalmente é cercada de gentilezas, descambou em um bate-boca inédito na história da presidência americana

Por Estadão

6 mins de leitura

em 01 de mar de 2025, às 07h46

Foto: Reprodução | Internet | BBC
Foto: Reprodução | Internet | BBC

Donald Trump e seu vice-presidente, J.D. Vance, se envolveram nesta sexta-feira (28), em uma discussão ríspida com o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, no Salão Oval da Casa Branca. A reunião diante das câmeras, que normalmente é cercada de gentilezas, descambou em um bate-boca inédito na história da presidência americana, arruinando a assinatura de um acordo para exploração de minerais e sinalizando uma ruptura que já vinha se desenhando nas relações entre dois aliados da guerra contra a Rússia.

Confronto 

Até então, todos os líderes que visitaram a Casa Branca paparicaram Trump, para evitar a reação intempestiva do americano, como a imposição de tarifas comerciais ou o fim da ajuda dos EUA. Ontem, no entanto, Zelenski, presidente de um país sob ataque da Rússia, preferiu confrontar o presidente americano, que se irritou.

Trump e Vance fizeram dupla nas críticas a Zelenski, por não ser “grato o suficiente pelo apoio dos EUA na guerra”. Com a voz alterada, o presidente americano ameaçou abandonar completamente a Ucrânia se Zelenski não concordasse com os termos ditados por ele.

Proximidade

Depois que os jornalistas foram retirados do Salão Oval, Trump cancelou o restante da visita, incluindo uma entrevista coletiva conjunta e a cerimônia de assinatura do acordo sobre minerais – que daria aos EUA direito de explorar recursos naturais ucranianos como forma de pagamento pela ajuda militar.

Zelenski deixou a Casa Branca às pressas, entrou em um carro preto e partiu. “O presidente Zelenski não está pronto para a paz”, escreveu Trump na sua rede social. “Ele desrespeitou os EUA e o Salão Oval. Ele pode voltar quando estiver pronto para a paz.”

Comemoração em Moscou

O confronto deixou a Ucrânia em um limbo e foi comemorado em Moscou. A mídia estatal russa descreveu o encontro como uma “reprimenda pública” a Zelenski. Aleksandr Kareievski, apresentador do canal Rossiya 24, disse em seu programa noturno que a reunião “parecia mais um flagelo para Zelenski” e algo que “ninguém esperava de um presidente dos EUA”.

Há muito tempo, o presidente russo, Vladimir Putin, tenta afastar Ucrânia de seu mais importante patrono, os EUA. Ontem, o objetivo do Kremlin parecia cumprido. Ao gritar com Zelenski, o presidente americano expressou solidariedade a Putin, dizendo que os dois haviam suportado adversidades juntos, citando a investigação do Congresso sobre a interferência russa para elegê-lo na eleição de 2016.

Nunca um presidente americano atacou um líder estrangeiro em visita à Casa Branca de forma tão agressiva diante das câmeras de TV. Por vezes cortando a fala do ucraniano, Vance disse a Zelenski que era “desrespeitoso” ele ir ao Salão Oval e discutir temas delicados diante da imprensa e exigiu que ele agradecesse a Trump.

Na parede

Foi quando o presidente americano tomou a palavra irritado e disse ao ucraniano: “Você não está em uma boa posição neste momento. Você está apostando na Terceira Guerra Mundial. Ou você faz um acordo ou estamos fora”, disse Trump.

O resultado imediato da discussão foi o aparente fracasso do acordo que Zelenski vinha sendo pressionado a assinar, para entregar os direitos de mineração de terras raras, petróleo e gás para os EUA.

A visita de Zelenski tinha o objetivo de aparar as arestas com Trump, que nos últimos dias vinha reproduzindo o manual de propaganda de Putin, afirmando que a Ucrânia “começou” a guerra e chamando Zelenski de “ditador sem eleições”.

Quando Zelenski parecia ter concordado em assinar o acordo de minerais, ao longo da semana, Trump pareceu disposto a ser gentil, dizendo a repórteres, na quinta-feira, que não se lembrava do comentário sobre o ucraniano ser um ditador. Ontem, os dois se encontraram na Ala Oeste da Casa branca, apertaram as mãos cordialmente, e entraram.

Encontro hostil

O encontro se tornou hostil assim que eles se sentaram no Salão Oval diante dos jornalistas. Zelenski tentou explicar a história da guerra, observando que ela remontava a 2014, quando Moscou anexou a Crimeia e ocupou o leste da Ucrânia, dizendo que nenhum presidente americano conseguiu conter Putin desde então – incluindo Trump, que governou os EUA entre 2017 e 2021.

Foi aí que Vance começou a atacar Zelenski. “Acho uma falta de respeito da sua parte vir ao Salão Oval para dizer isso na frente da mídia americana. O senhor deveria estar agradecendo ao presidente por tentar pôr um fim a esse conflito”, disse.

Surpreso, Zelenski tentou responder e disse que os EUA poderiam se sentir ameaçados pela Rússia algum dia. “Vocês têm um belo oceano (no meio) e não se sentem agora, mas se sentirão no futuro”, afirmou o ucraniano.

Irritação

A afirmação tocou um nervo de Trump. “Não nos diga o que vamos sentir”, disse o presidente americano, levantando a voz. “Você não está em uma boa posição. Você não tem as cartas no momento.”

“Não estou jogando cartas”, respondeu Zelenski, a essa altura completamente superado pela dobradinha Trump-Vance e pela barreira da língua, se esforçando para manifestar sua indignação em um inglês às vezes claudicante.

A explosão de Trump com Zelenski contrasta com os elogios que ele faz a Putin e com a falta de concessões exigidas da Rússia. À medida que a reunião de ontem descambava para uma agressão, com dedos apontados e vozes levantadas, Trump começou a atacar também os jornalistas que o pressionavam para que ele dissesse como garantir que Putin não violaria um cessar-fogo. “Se acontecer alguma coisa? E se uma bomba cair na cabeça agora?”, respondeu Trump à pergunta de uma repórter.

Terminado o encontro constrangedor, as reações foram mistas – para Trump e Zelenski. Além das críticas já esperadas dos democratas, alguns congressistas republicanos lamentaram o episódio, enfatizando que Putin era um inimigo comum. Outros, como o senador Lindsey Graham, amigo de Trump, exigiram um pedido de desculpas do ucraniano.

Já Zelenski recebeu uma série de mensagens de solidariedade de líderes europeus, entre eles do francês Emmanuel Macron e do polonês Donald Tusk. O presidente ucraniano parece ter conquistado a simpatia de alguns deputados da oposição em Kiev, que elogiaram sua firmeza. Outros, como o opositor Volodmir Ariev, disseram esperar que os diplomatas sejam capazes de reparar o dano feito às relações com os EUA. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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