A importância da acessibilidade para eleições mais inclusivas
A acessibilidade transcende a inclusão, fortalecendo a nossa democracia
5 mins de leitura
em 19 de ago de 2024, às 11h33
Por Marcel Carone
A acessibilidade permeia nosso cotidiano de maneiras que, muitas vezes, passam despercebidas. Desde atravessar uma rua movimentada até descer escadas escuras em um cinema, acessar um cardápio virtual ou votar em uma urna eletrônica, a acessibilidade é essencial para garantir a autonomia e a inclusão de todas as pessoas, independentemente de suas capacidades.
No contexto eleitoral, a acessibilidade assume um papel vital para assegurar que o processo democrático seja verdadeiramente inclusivo. No Brasil, a população com deficiência é estimada em 18,6 milhões de pessoas com 2 anos ou mais, representando 8,9% dessa faixa etária, conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2022. Quase 1,5 milhão de eleitores com deficiência estão aptos a votar nas eleições municipais de outubro – o maior número já registrado. Dos 155.912.680 eleitores, 1.451.846 declararam à Justiça Eleitoral ter pelo menos uma deficiência. Esse número vem crescendo ao longo dos anos: em 2012, apenas 242.868 pessoas com deficiência estavam registradas; em 2016, eram 598.167 e, em 2020, 1.157.619, representando um aumento de aproximadamente 25% em relação a 2024. Essa evolução é resultado de novas adaptações nas urnas eletrônicas, como intérpretes de Libras, recursos de sintetização de voz, teclados em Braile e a possibilidade de assistência de uma pessoa de confiança durante a votação. Contudo, mesmo com avanços na legislação e políticas públicas de inclusão, muitos cidadãos ainda enfrentam barreiras significativas no processo eleitoral.
Imagine a realidade de uma pessoa com deficiência ou mobilidade reduzida ao tentar exercer seu direito de voto. As longas filas, a falta de sinalização adequada, informações confusas e seções lotadas podem se transformar em obstáculos que dificultam ou até impedem sua participação plena. É importante ressaltar que essa preocupação não se limita às pessoas com deficiência; a acessibilidade beneficia a todos, incluindo idosos, analfabetos e aqueles com mobilidade reduzida.
Medidas como o atendimento prioritário a pessoas com deficiência e mobilidade reduzida foram implementadas para garantir o acesso aos locais de votação. Entretanto, com o aumento da participação desse público, a demanda por melhorias e o reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiência tornaram-se ainda mais urgentes.
Vale destacar que a acessibilidade vai além das adaptações físicas e tecnológicas. Ela abrange também a comunicação e a informação durante o processo eleitoral. Muitas campanhas publicitárias ainda não utilizam todos os recursos previstos em lei, como audiodescrição e janela de Libras, e a comunicação online com os candidatos nem sempre é acessível, dificultando o acesso a informações essenciais.
Nesse contexto, a legislação brasileira tem avançado, embora de forma lenta. A primeira lei sobre os direitos das pessoas com deficiência foi promulgada em 1989, quase simultaneamente à Constituição Federal. A Lei Brasileira de Inclusão (LBI), criada em 2015, veio para assegurar e promover os direitos fundamentais desse grupo. Existem também decretos e resoluções específicas sobre acessibilidade nas eleições, como o Decreto n.º 5.296/2004 e a Resolução n.º 23.659/2021.
Entretanto, a implementação efetiva dessas leis enfrenta desafios. Um estudo realizado em 2020 revelou que 99,26% dos sites brasileiros apresentam problemas de acessibilidade, como a ausência de descrições de imagens e falta de audiodescrição, libras e legendas em vídeos. Essa realidade contraria não apenas a legislação, mas também o direito constitucional ao acesso à informação.
Para que as leis sejam efetivamente aplicadas, é fundamental a participação ativa das pessoas com deficiência em todo o processo eleitoral, desde a fiscalização até o desenvolvimento de novas ferramentas e soluções. A acessibilidade não é apenas uma questão de inclusão; é crucial para o fortalecimento da democracia.
É relevante conhecer as experiências e adaptações implementadas em outros países. Por exemplo, a Estônia permite o voto eletrônico, enquanto a Gâmbia desenvolveu um sistema de votação com tambores coloridos e sons distintos para facilitar o voto de pessoas não alfabetizadas. No Canadá, há serviços e ferramentas específicas para garantir a acessibilidade, especialmente para pessoas com deficiência auditiva e visual.
Apesar das diferenças entre os sistemas eleitorais, a busca por maior inclusão e acessibilidade é uma responsabilidade coletiva. Como cidadãos, devemos acompanhar e exigir a efetiva implementação das leis, garantindo que o processo eleitoral seja verdadeiramente democrático e acessível a todos.
A acessibilidade é, portanto, fundamental não apenas para a inclusão, mas para o fortalecimento da nossa democracia. Quando todos têm a oportunidade de participar plenamente do processo eleitoral, independentemente de suas capacidades, a representatividade e a legitimidade do sistema político são amplamente reforçadas.
Marcel Carone é jornalista, apresentador de tv, empresário, ativista social comprometido com a inclusão, Embaixador da Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Síndrome de Down do Espírito Santo Vitória Down, Idealizador da “Brigada 21” e do “Pelotão 21”. É diplomado pela ADESG – Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra e Comendador do 38° Batalhão de Infantaria do Exército Brasileiro.
As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do AQUINOTICIAS.COM
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