Adolescência e comportamento na escola

A adolescência é uma fase da vida marcada por intensas transformações, tanto físicas quanto emocionais. No ambiente escolar, essas mudanças se manifestam em comportamentos

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em 20 de ago de 2024, às 11h16

Foto: Ilustrativa/Pixabay
Foto: Ilustrativa/Pixabay

Por Eduardo Machado

A adolescência é uma fase da vida marcada por intensas transformações, tanto físicas quanto emocionais. No ambiente escolar, essas mudanças se manifestam em comportamentos que muitas vezes desafiam a autoridade e a convivência pacífica. Como professores, nos encontramos diante do desafio de guiar jovens em um período de grande vulnerabilidade, buscando o equilíbrio entre a orientação e o respeito à individualidade.

A filosofia, com sua vasta tradição de reflexão sobre a natureza humana, oferece ferramentas valiosas para compreendermos e abordarmos esses desafios. Platão, em sua obra A República, discute a importância da educação na formação do caráter, afirmando que a alma deve ser guiada pelo conhecimento e pela virtude. Contudo, ele também reconhece que essa formação não é um processo linear, mas sim um caminho repleto de obstáculos e desvios. Na adolescência, esses obstáculos se tornam mais evidentes. A busca por identidade, a necessidade de aceitação social e as mudanças hormonais contribuem para a instabilidade emocional e comportamental. Para lidar com essas questões, é fundamental que nós, educadores, adotemos uma postura humanista e empática, reconhecendo a complexidade do período que nossos alunos atravessam.

Erik Erikson, em sua teoria do desenvolvimento psicossocial, destaca que a adolescência é uma etapa de crise de identidade versus confusão de papéis. O adolescente está em busca de um sentido de si mesmo e de seu lugar no mundo. Esse processo, muitas vezes tumultuado, pode levar a conflitos com figuras de autoridade, como pais e professores. No entanto, esses conflitos são parte integrante do desenvolvimento e devem ser encarados com compreensão e paciência. Por exemplo, um aluno que questiona constantemente as regras da escola ou desafia o professor em sala de aula pode estar, na verdade, tentando afirmar sua autonomia ou buscando um sentido de pertencimento. Em vez de ver esse comportamento como pura insubordinação, é essencial que tentemos entender o que está por trás dessa atitude.

Uma abordagem prática para lidar com essas situações é a aplicação de técnicas de comunicação não-violenta, como proposta por Marshall Rosenberg. Quando um aluno interrompe a aula de forma constante, em vez de reagir com punições imediatas, podemos utilizar uma abordagem mais investigativa e empática. Perguntar ao aluno o que o levou a agir dessa maneira, sem julgamento, pode revelar sentimentos de frustração ou ansiedade. Um diálogo do tipo: “Percebi que você tem interrompido a aula com frequência. Há algo que você gostaria de compartilhar?” abre espaço para que o aluno expresse suas preocupações, permitindo que a situação seja resolvida de forma colaborativa. Outro exemplo pode ser a resistência de um grupo de alunos a participar de atividades em grupo. Muitas vezes, essa resistência pode estar ligada ao medo de exposição ou à falta de confiança nas próprias habilidades. Nesses casos, o professor pode incentivar a participação progressiva, oferecendo apoio e destacando os pontos fortes de cada aluno, de modo a construir um ambiente de segurança e respeito.

Além das abordagens comunicativas, incorporar reflexões filosóficas nas discussões em sala de aula pode ser uma maneira poderosa de ajudar os adolescentes a se conectarem com suas próprias experiências. Ao discutir temas como justiça, liberdade e responsabilidade, podemos convidar os alunos a refletirem sobre suas ações e escolhas em um contexto mais amplo. Por exemplo, ao explorar o conceito de liberdade em aula, podemos relacionar essa ideia ao comportamento dos alunos na escola. Discussões sobre liberdade podem incluir perguntas como: “Até que ponto somos livres para fazer o que queremos na escola?” ou “Como nossa liberdade impacta a liberdade dos outros?”. Esse tipo de reflexão ajuda os alunos a entenderem que suas ações têm consequências e que a verdadeira liberdade está associada à responsabilidade.

Criar um ambiente seguro e acolhedor é fundamental para que os alunos se sintam à vontade para expressar suas emoções e enfrentar seus desafios. Segundo Paulo Freire, a educação deve ser emancipadora e construída a partir do diálogo. Isso significa que a sala de aula deve ser um espaço onde todos os alunos se sintam ouvidos e respeitados, independentemente de suas dificuldades ou comportamentos. Uma prática eficaz para promover esse ambiente é a realização de rodas de conversa regulares, onde os alunos têm a oportunidade de compartilhar suas experiências e sentimentos em um espaço seguro e sem julgamentos. Esses momentos permitem que os adolescentes reconheçam que não estão sozinhos em suas lutas e que seus colegas também enfrentam desafios semelhantes.

Além disso, o estabelecimento de normas de convivência construídas coletivamente pode ajudar os alunos a se sentirem mais responsáveis pelo ambiente escolar. Quando as regras são impostas de cima para baixo, a tendência é que sejam vistas como autoritárias. No entanto, quando os alunos participam da criação dessas regras, elas se tornam parte de um contrato social que todos se comprometem a respeitar. Outro aspecto crucial é o apoio emocional. Muitas vezes, os comportamentos desafiadores na escola são sintomas de questões mais profundas, como problemas familiares, baixa autoestima ou dificuldades de socialização. Por isso, é importante que a escola ofereça suporte adequado, seja por meio de orientadores educacionais, psicólogos escolares, ou até mesmo programas de mentoria.

Uma solução prática é a criação de parcerias com profissionais de saúde mental para a realização de oficinas ou palestras voltadas para o desenvolvimento emocional dos alunos. Essas iniciativas podem abordar temas como autoestima, gestão de conflitos e resiliência, oferecendo aos alunos ferramentas práticas para lidar com seus desafios cotidianos. O ambiente escolar deve ser um reflexo dos valores que desejamos cultivar na sociedade. Segundo Paulo Freire, a educação é um ato político e, como tal, deve ser emancipadora. Ao promover o respeito mútuo e a solidariedade, estamos não apenas contribuindo para a formação de indivíduos éticos, mas também para a construção de uma sociedade mais justa.

Por exemplo, atividades que incentivem o trabalho em equipe e o respeito às diferenças, como projetos interdisciplinares ou trabalhos comunitários, ajudam os alunos a desenvolverem empatia e a perceberem a importância da cooperação. Incentivar o diálogo e a resolução pacífica de conflitos também é uma prática que pode ser incorporada nas dinâmicas escolares, reforçando o valor do respeito e da solidariedade. A adolescência é, sem dúvida, um período desafiador, tanto para os jovens quanto para os adultos que os cercam. No entanto, ao adotar uma perspectiva filosófica e humanista, podemos transformar esses desafios em oportunidades de crescimento e aprendizado mútuo. O diálogo aberto, a empatia e o respeito à individualidade são fundamentais para ajudar nossos alunos a navegarem por essa fase complexa e emergirem como adultos conscientes e responsáveis.

Como educadores, devemos lembrar que estamos não apenas ensinando conteúdos acadêmicos, mas também contribuindo para a formação de seres humanos capazes de pensar criticamente e agir com ética. Ao aplicar soluções práticas, como a comunicação não-violenta, a criação de ambientes acolhedores e o apoio emocional, temos a oportunidade de realmente fazer a diferença na vida de nossos alunos e, por extensão, no mundo em que vivemos.

** Eduardo Machado é filósofo e professor especialista de Filosofia, licenciado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do AQUINOTICIAS.COM

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