Autoestima e educação nas escolas públicas

Essa é uma tarefa que vai além das provas e dos currículos, tocando naquilo que é mais essencial para o desenvolvimento humano.

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em 21 de nov de 2024, às 14h30

Foto ilustrativa: Pixabay
Foto ilustrativa: Pixabay

Por Eduardo Machado

Quando penso no papel do professor em uma escola pública estadual, especialmente em nossa realidade capixaba, uma palavra sempre se destaca: respeito. Não apenas o respeito que devemos ter pelos outros, mas, principalmente, o respeito que precisamos ajudar nossos alunos a ter por si mesmos. Como professor de filosofia, é meu dever não só ensinar conteúdos teóricos, mas também inspirar um senso profundo de dignidade e autorrespeito em cada estudante que encontro. Essa é uma tarefa que vai além das provas e dos currículos, tocando naquilo que é mais essencial para o desenvolvimento humano.

A autoestima, essa joia frágil e preciosa, precisa ser cuidadosamente cultivada. Muitos dos nossos alunos chegam às salas de aula com histórias de vida marcadas por desafios e por uma constante sensação de desvalorização. Eles enfrentam não apenas dificuldades acadêmicas, mas também lutas pessoais que, muitas vezes, tornam o simples ato de acreditar em si mesmos um grande desafio. Em um ambiente escolar, onde a comparação e a cobrança podem ser esmagadoras, como podemos, então, construir essa base de autoconfiança e respeito próprio?

A filosofia oferece respostas. Sócrates, com sua famosa máxima “Conhece-te a ti mesmo”, nos ensina que o autoconhecimento é a chave para uma vida significativa. E para os adolescentes, que vivem um turbilhão de transformações e incertezas, esse ensinamento é fundamental. Precisamos ajudá-los a entender que seu valor não está vinculado a uma nota ou a um desempenho específico, mas à sua capacidade de aprender, crescer e contribuir para o mundo. Esse é o primeiro passo para uma educação que transcende o conteúdo e toca no humano.

No entanto, ensinar autoestima não é tarefa simples. É fácil cair na armadilha de reforçar padrões que minam a confiança dos alunos. Comentários desnecessários, comparações injustas e uma visão punitiva dos erros são alguns dos comportamentos que precisamos eliminar das práticas escolares. Quando tratamos o fracasso como uma marca de incapacidade e não como uma oportunidade de aprendizado, estamos perpetuando a ideia de que o erro é inaceitável. E esse medo de errar paralisa. Ele destrói a criatividade, desmotiva, e, o pior de tudo, ensina aos nossos jovens que eles não são bons o suficiente.

E o que fazer, então, para combater essa cultura? Primeiro, é necessário um olhar atento e cuidadoso. Reconhecer os esforços dos alunos, independentemente do resultado final, é uma forma de valorizar o processo e não apenas o produto. Cada estudante tem sua própria história, seus próprios desafios, e é essencial que eles se sintam vistos e compreendidos. O elogio genuíno, o incentivo constante, e a valorização das pequenas conquistas são gestos simples, mas poderosos, que podem mudar completamente a percepção de um jovem sobre si mesmo.

A prática filosófica nos oferece um caminho, pois nos ensina a questionar e a refletir. Os alunos precisam ser incentivados a se perguntar: “O que me faz feliz? O que me motiva? Quem sou eu para além das expectativas que os outros têm de mim?” Essas são questões fundamentais que abrem espaço para o autoconhecimento e, consequentemente, para o autorrespeito. Mas, para que isso aconteça, a escola deve ser um espaço onde os alunos se sintam seguros para se expressar sem medo de julgamento.

Por outro lado, também é necessário ser crítico em relação àqueles educadores que, consciente ou inconscientemente, perpetuam práticas prejudiciais. Professores que desencorajam, que subestimam ou que não acreditam na capacidade dos alunos estão fazendo um desserviço à educação. Quando um professor desrespeita ou desmoraliza um estudante, ele não apenas destrói a confiança daquele jovem, mas compromete a missão maior da educação, que é formar cidadãos plenos, seguros e conscientes de seu valor. Precisamos reconhecer que ainda há um longo caminho a ser percorrido, que nem todos os ambientes escolares são acolhedores, e que a transformação começa com a autorreflexão e a vontade de mudar.

Por isso, celebro os educadores que fazem a diferença. Aqueles que, com dedicação e empatia, conseguem criar uma atmosfera de respeito e confiança, onde os alunos se sentem valorizados e inspirados a se superarem. Professores que acreditam nos seus alunos, que têm paciência para ouvir, que compreendem as nuances de cada história, e que sabem que sua influência vai muito além da sala de aula. Eles são verdadeiros agentes de mudança, capazes de transformar o destino de jovens que, sem essa inspiração, poderiam nunca acreditar no próprio potencial.

E, claro, é importante lembrar que o respeito próprio não é algo que se constrói do dia para a noite. É um processo contínuo, feito de pequenas vitórias e de muitas reflexões. Nossa missão, como professores de filosofia, é iluminar esse caminho. Ensinar aos nossos alunos que o respeito por si mesmos é a base para todas as suas futuras conquistas, e que, mesmo em meio às adversidades, eles têm em si um valor que ninguém pode tirar.

Em última instância, precisamos acreditar que a escola pública pode e deve ser um espaço de construção de cidadania, dignidade e autoconfiança. Quando ensinamos filosofia, não estamos apenas oferecendo uma disciplina; estamos plantando sementes que, com cuidado e atenção, podem florescer em seres humanos plenos, conscientes de seu valor e prontos para enfrentar o mundo. Que possamos, então, continuar nessa missão, com coragem e esperança, sabendo que cada gesto de respeito e de valorização faz toda a diferença.  

** Eduardo Machado é filósofo e professor especialista de Filosofia, licenciado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do AQUINOTICIAS.COM

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