Família e escola: alianças e diferenças

A educação é um dos processos mais complexos e transformadores na formação de qualquer ser humano. No entanto, um dos maiores equívocos

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em 22 de jan de 2025, às 17h36

Foto: Ilustrativa/Pixabay
Foto: Ilustrativa/Pixabay

Por Eduardo Machado

A educação é um dos processos mais complexos e transformadores na formação de qualquer ser humano. No entanto, um dos maiores equívocos contemporâneos é confundir os papéis da escola e da família, atribuindo a uma instituição aquilo que é responsabilidade da outra. Embora tanto a família quanto a escola compartilhem o objetivo de contribuir para o desenvolvimento das crianças e jovens, cada uma desempenha um papel único e insubstituível nesse processo.

A família é, por natureza, o primeiro espaço de aprendizado. É nela que os valores, os princípios e as primeiras noções de convivência são transmitidos. O ambiente familiar molda a forma como a criança percebe o mundo e a si mesma. É na relação com os pais, avós e outros cuidadores que ela aprende o que é respeito, empatia, cooperação e, sobretudo, o amor incondicional. Esses fundamentos emocionais são a base sobre a qual se constrói qualquer outro aprendizado. Sem um alicerce emocional sólido, as experiências escolares podem ser vividas de maneira fragmentada ou até mesmo desgastante.

A escola, por outro lado, é o espaço privilegiado para o desenvolvimento do conhecimento sistematizado e da socialização ampliada. É ali que a criança tem acesso a conteúdos científicos, artísticos e culturais, e onde aprende a interagir com um grupo maior, lidando com as diversidades e desafios do coletivo. A escola não é — e nunca será — um substituto para o lar. Ela é uma extensão, um complemento, um espaço onde o aprendizado familiar encontra a oportunidade de expandir-se para horizontes mais amplos.

No entanto, o que frequentemente ocorre é a tentativa de transferir à escola responsabilidades que são exclusivas da família. Muitos pais, sobrecarregados pelas demandas da vida moderna ou, por vezes, por desconhecimento, esperam que professores e escolas ensinem não apenas conteúdos curriculares, mas também valores morais, disciplina e até mesmo noções básicas de convivência. Embora a escola possa e deva reforçar esses aspectos, ela não é o local de origem dessas aprendizagens.

Por outro lado, há também o risco inverso: famílias que acreditam que sua tarefa termina quando a criança atravessa o portão da escola. Essa desconexão entre família e escola gera um abismo que impacta negativamente o desenvolvimento integral dos estudantes. A educação, em seu sentido mais amplo, exige uma parceria harmoniosa e complementar entre esses dois pilares. Quando família e escola dialogam, compartilham valores e se apoiam mutuamente, os resultados são mais consistentes e profundos.

No papel de educador, é possível perceber com clareza como essa parceria (ou sua ausência) influencia a vida dos estudantes. Uma criança que é escutada, amada e orientada em casa tende a chegar à escola mais aberta ao aprendizado, mais segura de suas capacidades e mais apta a lidar com os desafios sociais e acadêmicos. Em contrapartida, estudantes que enfrentam negligência ou um ambiente familiar disfuncional frequentemente carregam para a sala de aula um peso emocional que pode dificultar o aprendizado e as relações interpessoais.

Isso não significa que a família deva ser perfeita — nenhuma é. Mas é fundamental que ela esteja presente. Presença não é apenas física, mas emocional. É acompanhar a rotina escolar, ouvir sobre as conquistas e dificuldades, e mostrar interesse genuíno pelo que acontece no mundo da criança. É, também, estabelecer limites claros e oferecer suporte diante dos desafios, sem terceirizar para a escola responsabilidades que são do lar.

Por outro lado, cabe à escola reconhecer e respeitar a diversidade das configurações familiares e dos contextos em que os estudantes estão inseridos. A escola precisa estar preparada para acolher e trabalhar em conjunto com famílias que enfrentam suas próprias dificuldades. O diálogo é a chave para construir pontes e superar barreiras.

É importante também que professores estejam atentos para não perpetuar preconceitos ou estabelecer expectativas irreais em relação às famílias. Muitas vezes, o julgamento sobre o que constitui uma “boa família” pode ser mais prejudicial do que a ausência de diálogo. A escola não pode ser apenas crítica; ela precisa ser parceira, uma aliada que se comprometa com o desenvolvimento integral dos estudantes, independentemente das condições familiares.

Em última instância, a educação não é apenas sobre ensinar o que está nos livros, mas sobre formar pessoas capazes de viver em sociedade de forma plena e responsável. Para isso, família e escola precisam trabalhar juntas, reconhecendo suas diferenças, respeitando seus papéis e, acima de tudo, colocando o bem-estar e o desenvolvimento das crianças como prioridade absoluta.

A família é o porto seguro. A escola é o horizonte. Juntas, elas constroem pontes para que cada criança possa atravessar a vida com segurança, conhecimento e coragem. Afinal, educar é um ato coletivo, mas que só funciona quando todos os envolvidos estão dispostos a caminhar na mesma direção.

** Eduardo Machado é filósofo e professor especialista de Filosofia, licenciado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do AQUINOTICIAS.COM

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