Quando ensinar se torna um ato de coragem
Alvos da negligência, da violência, do descaso institucional. Basta abrir os olhos – e as manchetes – para ver o sangue escorrendo pelas lousas
3 mins de leitura
em 24 de abr de 2025, às 10h10

Por Eduardo Machado
Num país onde os professores deveriam ser faróis de esperança e conhecimento, transformaram-se em alvos. Alvos da negligência, da violência, do descaso institucional. Basta abrir os olhos – e as manchetes – para ver o sangue escorrendo pelas lousas. Os números são alarmantes, mas a frieza dos dados não consegue traduzir o horror cotidiano vivido por quem ousa ensinar.
Sim, ousa. Porque dar aula hoje é, antes de tudo, um ato de resistência. Não só à precariedade estrutural, aos salários humilhantes e à sobrecarga de trabalho. É também resistência à hostilidade crescente que se infiltra nos corredores escolares, armada com palavras, ameaças e – cada vez mais – com socos, empurrões, cadeiras arremessadas e armas brancas.
A escola, que deveria ser espaço de proteção e crescimento, tem se tornado palco de agressões físicas e psicológicas contra educadores. E a sociedade? Silencia. Romantiza. Normaliza. Culpa o professor, como quem diz: “se apanhou, alguma coisa fez”. E assim, vamos empilhando corpos feridos no altar da indiferença nacional.
Pior: há gestores que se calam – ou, pior ainda, que encobrem. Superintendências e secretarias que não querem “manchar o nome da escola”. Como se a reputação institucional fosse mais importante que a integridade dos seres humanos que a sustentam. Há professores que denunciam e são punidos. Sofrem represálias, são vistos como “problemáticos”, “críticos demais”, “difíceis de lidar”. Porque a máquina burocrática não suporta ruídos. Ela quer silêncio. Quer omissão.
A cultura de violência contra professores é também uma cultura de abandono. Um abandono orquestrado, envernizado por discursos bonitos de valorização da educação. Mas não há valorização onde há medo. Não há ensino onde há ameaça. Não há projeto de país onde não há respeito pelos seus educadores.
Chega. Chega de discursos vazios, de campanhas publicitárias que tentam maquiar a realidade com palmas e sorrisos. O que precisamos é de ação concreta. Políticas de proteção real ao professor. Protocolos firmes para lidar com agressões. Apoio psicológico, jurídico e institucional para quem é vítima. E, acima de tudo, um pacto coletivo de respeito àqueles que dedicam a vida à formação de outras vidas.
A cada tapa que um professor leva, é a democracia que sangra. A cada ameaça silenciada, é a cidadania que recua. E se hoje ainda existem educadores em sala de aula, é porque, mesmo feridos, ainda acreditam. Ainda lutam. Mas até quando?
Não podemos esperar o primeiro assassinato televisionado para agir. Já perdemos tempo demais. E o tempo, como a dignidade, não aceita mais ser pisado.
** Eduardo Machado é filósofo e professor especialista de Filosofia, licenciado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).
As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do AQUINOTICIAS.COM
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