Quando os apoios certos transformam vidas

A qualidade de vida das pessoas com síndrome de Down está diretamente ligada à presença de redes de apoio familiares, comunitárias e institucionais

Maria Clara é capixaba, formada em gastronomia e reconhecida como símbolo da verdadeira inclusão

Por Marcel Carone

A síndrome de Down (SD), também conhecida como trissomia do cromossomo 21, é uma condição genética que afeta o desenvolvimento físico e cognitivo. Durante muito tempo, foi vista apenas sob a ótica da limitação, mas os avanços científicos e sociais mostram que, quando pessoas com SD recebem os apoios adequados, elas podem expressar plenamente suas capacidades, desenvolver autonomia e contribuir de forma significativa para a sociedade.

Estudos recentes demonstram que a qualidade de vida das pessoas com síndrome de Down está diretamente ligada à presença de redes de apoio familiares, comunitárias e institucionais. A inclusão escolar, a possibilidade de inserção no mercado de trabalho e a participação em atividades culturais e esportivas elevam sua autoestima e favorecem o desenvolvimento de habilidades cognitivas e sociais.

Outro ponto essencial é a saúde mental. Intervenções educacionais e programas de inclusão reduzem significativamente problemas emocionais e aumentam a resiliência, além de melhorar o engajamento social.

A escola é um dos ambientes mais poderosos de transformação. Crianças com SD, quando inseridas em contextos de ensino inclusivo, apresentam ganhos na linguagem, na cognição e na socialização. A interação com colegas sem deficiência estimula a aprendizagem, ao mesmo tempo que sensibiliza toda a comunidade escolar para a diversidade. Pesquisas indicam que a adaptação de metodologias de ensino, como o uso de recursos visuais, rotinas estruturadas e reforço positivo, potencializa significativamente a aprendizagem dessas crianças.

Exemplos de superação são inúmeros. Em vários países, jovens com SD completaram a educação básica e ingressaram na universidade, desafiando estereótipos. Esses casos não são exceções isoladas, mas sim evidências de que, com estímulo adequado, a aprendizagem é possível e efetiva.

A entrada no mercado de trabalho é outro marco importante. Adultos com SD podem desempenhar funções laborais variadas quando recebem treinamento e apoio contínuo. Isso não apenas promove independência financeira, mas também fortalece sua identidade social.

Empresas que adotam políticas inclusivas relatam benefícios mútuos: os trabalhadores com SD contribuem com dedicação, responsabilidade e espírito colaborativo, enquanto os ambientes de trabalho tornam-se mais diversos e humanos. Casos de pessoas com SD atuando em supermercados, restaurantes, escritórios e até em funções artísticas têm ganhado visibilidade e inspiram novas iniciativas.

Um estudo intitulado “O valor que os colaboradores com síndrome de Down podem agregar às organizações”, desenvolvido pela consultoria McKinsey & Company em parceria com o projeto Outro Olhar, do Instituto Alana, foi apresentado na sede das Nações Unidas (ONU), em Nova York. A pesquisa revelou que a inclusão de pessoas com síndrome de Down gera impacto positivo em cinco das nove dimensões que compõem a saúde organizacional, entre elas liderança, satisfação do cliente, cultura e clima, motivação da equipe e coordenação e controle. Além disso, apontou que empresas classificadas como saudáveis têm maior probabilidade de alcançar margens de EBITDA e de lucro líquido acima da média.

Além da educação e do trabalho, o envolvimento em atividades culturais, esportivas e comunitárias amplia ainda mais o potencial dessas pessoas. O esporte adaptado, por exemplo, melhora não apenas a saúde física, mas também promove disciplina, autoestima e integração social. Atletas com SD já participaram de campeonatos nacionais e internacionais, mostrando que a superação de limites é uma realidade concreta.

Outro aspecto fundamental é a vida independente. Programas de treinamento para autonomia em atividades diárias, como cozinhar, organizar finanças e usar transporte público, são eficazes e permitem que pessoas com SD conquistem níveis variados de independência, rompendo com a visão de dependência permanente.

Exemplo de histórias ilustram essa potência:

Pablo Pineda, espanhol com síndrome de Down, tornou-se o primeiro europeu com SD a concluir uma graduação universitária e hoje é palestrante e escritor, defendendo a inclusão como caminho de transformação social.

Maria Clara (@casalc21), brasileira com síndrome de Down, construiu uma trajetória marcada por conquistas e inspiração. Casada, formada em gastronomia, empresária, palestrante e atriz, ela também teve a honra de carregar a tocha olímpica e já participou de programas de televisão em rede nacional, entre muitas outras realizações. Hoje, é reconhecida como um símbolo da verdadeira inclusão, sendo exemplo vivo de superação, independência e autonomia.

Isabella Springmühl Tejada, da Guatemala, tornou-se a primeira estilista com SD a expor sua coleção em Londres, mostrando como a moda pode ser um espaço de afirmação e talento.

Esses exemplos não são exceções isoladas: são reflexos de um sistema de apoio que valoriza as capacidades, não as limitações.

A síndrome de Down não deve ser vista apenas como uma condição limitante, mas como um campo de potencialidades que se manifestam plenamente quando há apoio familiar, educacional, social e institucional. A ciência comprova que, com intervenções adequadas, pessoas com SD podem estudar, trabalhar, praticar esportes, viver de forma independente e inspirar a sociedade com histórias de superação.

Mais do que incluir, trata-se de reconhecer que a diversidade enriquece toda a comunidade. A síndrome de Down é, sim, uma potência; basta que a sociedade ofereça as ferramentas certas para que cada pessoa floresça em sua singularidade.

***Marcel Carone é jornalista, apresentador de tv, empresário, ativista social comprometido com a inclusão, Embaixador da Associação de Pais, Amigos e Pessoas com Síndrome de Down do Espírito Santo Vitória Down, Idealizador da “Brigada 21” e do “Pelotão 21”. É diplomado pela ADESG – Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra e Comendador do 38° Batalhão de Infantaria do Exército Brasileiro.

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