Importância dos laços na vida escolar

É essencial estar atento para que as amizades não se tornem instrumentos de exclusão ou dominação

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em 04 de dez de 2024, às 16h39

Imagem ilustrativa: Pixabay
Imagem ilustrativa: Pixabay

Por Eduardo Machado

A amizade é, sem dúvida, uma das forças mais transformadoras da vida humana. Para mim, que sou profundamente grato pelas amizades que cultivo — especialmente pelo meu melhor amigo, cuja presença é um pilar inabalável em minha jornada —, refletir sobre essa relação é também um convite a pensar como esses laços impactam a vida dos estudantes. Afinal, a escola não é apenas um lugar de aprendizado formal, mas também um espaço onde se tecem histórias, se constroem relações e se compartilham os desafios e as alegrias de crescer.

A filosofia nos oferece um rico repertório para pensar a amizade. Aristóteles, por exemplo, via nela uma das formas mais nobres de vínculo humano, essencial para a felicidade. Ele identificava três tipos de amizade: a de utilidade, a de prazer e a de virtude. Esta última, baseada no mútuo desejo pelo bem do outro, era, para ele, a mais elevada. E é essa amizade que podemos ajudar nossos estudantes a compreender e valorizar: uma relação que transcende interesses momentâneos e se enraíza em valores profundos, como respeito, confiança e reciprocidade.

Na vida escolar, a amizade desempenha um papel ainda mais crucial. Durante a adolescência, em meio a tantas mudanças e incertezas, os amigos se tornam refúgios, conselheiros e parceiros de aventuras. Eles são os primeiros a ouvir nossos sonhos, os primeiros a rir das nossas piadas e, muitas vezes, os primeiros a estender a mão quando tropeçamos. Para muitos estudantes, especialmente aqueles que enfrentam desafios fora da escola, a amizade é o fio que os mantém conectados e motivados, muitas vezes, mais ainda que as próprias famílias.

Como professores, temos uma responsabilidade delicada e poderosa nesse processo. Precisamos criar ambientes onde a amizade possa florescer de maneira saudável, onde os alunos se sintam seguros para serem quem são e para estabelecer conexões genuínas. Mas isso exige mais do que promover trabalhos em grupo ou organizar atividades coletivas. É preciso cultivar uma cultura de empatia, de escuta e de respeito mútuo, onde as diferenças sejam acolhidas e as semelhanças, celebradas.

Ao mesmo tempo, é essencial estar atento para que as amizades não se tornem instrumentos de exclusão ou dominação. Infelizmente, o ambiente escolar também pode ser palco de bullying, rivalidades e dinâmicas tóxicas que minam a autoestima e a confiança dos jovens. Aqui, a filosofia nos ajuda novamente, ensinando-nos a pensar criticamente sobre as relações que construímos e a questionar o que nos aproxima e o que nos afasta dos outros.

Por isso, acredito que o papel do professor vai além de mediador. Ele deve ser um modelo de respeito, solidariedade e acolhimento. Quando mostramos aos alunos que cada indivíduo tem valor intrínseco, ajudamos a construir relações mais justas e respeitosas. Além disso, compartilhar histórias sobre a importância das amizades em nossas vidas pode inspirar os estudantes a valorizar os laços que têm — e a buscar relações que os engrandeçam.

A amizade, no entanto, não é apenas importante para os jovens. Ela nos transforma em todas as fases da vida. No meu caso, é impossível pensar quem sou hoje sem reconhecer o impacto das amizades que construí. Meu melhor amigo, em particular, não é apenas um companheiro; é uma bússola pré-moral, alguém que me ajuda a reencontrar meu caminho quando me sinto perdido. Essa relação me lembra, todos os dias, que não estamos sozinhos, que crescer é sempre mais fácil quando temos alguém ao nosso lado para dividir as dores e as conquistas.

E é esse sentimento que desejo que meus alunos descubram. Quero que entendam que a amizade verdadeira é uma dádiva, um encontro entre almas que se reconhecem e se respeitam. Quero que saibam que, assim como aprender sobre a Revolução Francesa ou os fundamentos do Existencialismo, aprender a cultivar e valorizar as amizades é uma das lições mais importantes que a escola pode oferecer.

Por fim, quando penso em como a amizade pode ser transformadora, lembro-me de que a escola não é apenas um espaço de formação acadêmica, mas também um lugar onde os alunos começam a moldar quem são como seres humanos. E, nesse processo, as amizades que cultivam, os laços que fortalecem e as conexões que constroem são tão importantes quanto qualquer conteúdo ensinado.

Que sejamos, então, professores que incentivem esses laços, que inspirem relações baseadas na virtude e que demonstrem, pelo exemplo, o poder da amizade em nossas vidas. Porque, no fundo, ensinar é isso: tocar vidas e formar redes de amor, respeito e confiança. Que nossos alunos encontrem amigos que sejam para eles o que meu melhor amigo é para mim — e que essas amizades sejam faróis a guiá-los em todas as suas jornadas.

** Eduardo Machado é filósofo e professor especialista de Filosofia, licenciado pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do AQUINOTICIAS.COM

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